O Blog COMER CAFÉ publica a pesquisa científica realizada por grupo de pesquisadores da EMBRAPA CAFÉ e EPAMIG apresentado em outubro de 2019 no X Simpósio de Pesquisas dos Cafés no Brasil, em Vitória, no Espírito Santo.
Foi a partir das informações colhidas em fontes norte-americanas e este trabalho que o cafeicultor e jornalista Eustaquio Augusto dos Santos, editor deste Blog, passou a trabalhar com os pesquisadores para desenvolver o projeto Café com Pão, implantá-lo na Fazenda Paiol, em Três Corações, no sul de Minas, e levar este conhecimento aos interessados em produzir a super farinha da polpa e casca da fruta de café cereja e um extrato líquido, uma calda, proveniente da polpa, que poderá ser de grande interesse para indústrias de bebidas, cosméticos e farmacêuticas.
Segue a íntegra da pesquisa dos mineiros:
TEORES DE
NUTRIENTES NO EXTRATO MUCILAGINOSO E NA FARINHA DA CASCA DOS FRUTOS DE CAFÉ1
Sammy
Fernandes Soares2; Juarez de Sousa e Silva3, Aldemar Polonini Moreli4, Sérgio Maurício Lopes Donzeles5, Marcelo de Freitas Ribeiro6, Douglas Gonzaga Victor7, Victor Sérgio dos Santos
1 Trabalho financiado pelo Consórcio Pesquisa Café.
2 Pesquisador, DS, Embrapa Café/ EPAMIG, sammy.soares@embrapa.br
3 Professor Voluntário, PhD, DEA/UFV, Bolsista Consórcio
Pesquisa Café, juarez@ufv.br
4 Professor, DS, IFES, Campus de Venda
Nova do Imigrante, aldemarpolonin@gmail.com
5 Pesquisador, DS,
EPAMIG SUDESTE, slopes@epamig.br
6 Pesquisador, DS, EPAMIG SUDESTE,
mribeiro@epamig.ufv.br
7 Bolsista Consórcio Pesquisa Café, BS,
douglas.vitor@ufv.br
8 Estudante de Agronegócio, UFV,
estagiário na EPAMIG, vitor.santos.sergio@gmail.com
RESUMO: O processamento dos frutos de café visando obter o
café cereja descascado gera como resíduos a casca, que é aproveitada na
adubação e na alimentação animal, e a mucilagem, que sai junto com a água
residuária. O trabalho teve como objetivo determinar os teores de nutrientes no
extrato mucilaginoso e na farinha da casca dos frutos de café das variedades
Oeiras, Catiguá e Catuaí Vermelho. Os frutos de café foram lavados em água
potável e descascados, sem usar água no descascador. O café cereja descascado foi
posto em bandeja de plástico com água suficiente para recobrir os grãos e, no
dia seguinte, peneirou-se o café e separou-se o extrato mucilaginoso. A casca
foi posta para secar, em estufa com ventilação forçada, e depois foi moída.
Amostras do extrato mucilaginoso e da farinha da casca dos frutos foram
analisados em laboratório, conforme métodos usuais de análise de efluentes e
alimentos. Os níveis de K, Ca, Mg e Na, determinados no extrato mucilaginoso
das variedades Oeiras, Catiguá e Catuaí Vermelho
variaram de 662 a 3307, 154 a 317, 60 a 114 e 12 a 108 mg.L-1e o
teor de proteína, carboidrato, fibra, gordura e K na farinha das variedades
Oeiras e Catiguá foram 9 e 8, 65 e 68, 19 e 12, 1 e 0.8, e 2700 e 5150 g.100 g-1,
respectivamente. O extrato mucilaginoso e a farinha da casca dos frutos
de café podem ser aproveitados pela indústria para fabricação de vários
produtos.
PALAVRAS-CHAVE: pós
colheita, processamento, resíduo
NUTRIENT CONTENT IN MUCILAGINOUS EXTRACT AND SHELL FLOUR OF COFFEE FRUIT 1
ABSTRACT:
The processing of coffee fruits to obtain the peeled
cherry coffee generates as residues the shell, which is used in fertilization
and animal feed, and the mucilage, which comes out with the wastewater. The
objective of this work was to determine the nutrient content in mucilaginous
extract and shell flour of the coffee fruits of the Oeiras, Catiguá and Catuaí
Vermelho varieties. The coffee fruits were washed, using potable water and
peeled without using water in the peeler. The peeled cherry coffee was placed
in a plastic tray with water to cover the beans and in the next day the coffee
was sieved and the mucilaginous extract was separated. The husks were put to
dry in a forced ventilated oven and ground after drying. Samples of
mucilaginous extract and fruit shell flour were analyzed in the laboratory,
according to usual methods of effluents and food analysis. The levels of K, Ca,
Mg and Na, determined in the mucilaginous extract of the Oeiras, Catiguá and
Catuai Vermelho varieties ranged from 662 to 3307, 154 to 317, 60 to 114 and 12
to 108 mg.L-1. The protein contents, carbohydrate, fiber, fat and K
in the flour of the Oeiras and Catiguá varieties were 9 and 8, 65 and 68, 19
and 12, 1 and 0.8, and 2700 and 5150 g/100g, respectively. The mucilaginous
extract and the flour of the coffee fruit husk can be use by the industry to
manufacture various products.
KEY WORDS: post harvest, processing, waste.
INTRODUÇÃO
O
fruto de café é constituído pelo exocarpo, mesocarpo e endocarpo, comumente
denominados casca, polpa e pergaminho, respectivamente, e pela semente,
envolvida pelo pergaminho. A casca dos frutos de café maduros, pode ser
separada da semente mediante pressão com os dedos; a camada sólida da polpa e
parte da líquida, denominada mucilagem, fica aderida à casca, enquanto a outra
parte fica junto ao pergaminho. Nas unidades de processamento os frutos passam
pelas operações de limpeza e lavagem, e, com menor frequência, pelo descascamento
e remoção da mucilagem. A retirada da casca reduz o volume de material e o
tempo na secagem do café, diminuindo o custo desta operação, além de
possibilitar a formação de lotes de café descascado de frutos maduros, dos
quais se obtêm as melhores bebidas. Na etapa de descascamento, parte da
mucilagem adere-se às cascas e aos grãos descascados e parte sai na água que
passa pelo descascador. Para facilitar o manejo na secagem, remove-se
parcialmente a mucilagem aderida aos grãos, pelo processo mecânico usando desmucilador
ou pelo processo natural através de tanque de degomagem com água. A casca é
aproveitada na adubação e na alimentação animal, enquanto a mucilagem é
descartada, junto com a água do processamento. A casca e a polpa do café contem
carboidratos, gorduras, proteínas e minerais, podendo ser aproveitada na
alimentação de ruminantes, substituindo parte dos alimentos volumosos
necessários (BARCELOS & GONÇALVES, 2011). Segundo Southey (1919), a farinha
da casca de café vem sendo usada como ingredientes na fabricação de vários
produtos alimentares. A casca é comprada dos cafeicultores pela Coffee Cherry
Co. e transformada em farinha rica em antioxidantes e fibras e sem glúten. O
trabalho teve como objetivo determinar os teores de K, Ca Mg e Na no extrato
mucilaginoso dos grãos e de proteína, carboidrato, gordura, fibra e minerais na
farinha da casca de café.
MATERIAL
E MÉTODOS
Foram
utilizados frutos de café das variedades Oeiras e Catiguá, com casca de cor
vermelha e amarela, respectivamente, produzidos na fazenda Boa Safra, situada
no município de Paula Cândido - MG, e da variedade Catuaí Vermelho, produzidos
em duas propriedades vizinhas, situadas no município de Araponga - MG. No dia
em que foram colhidos, os frutos foram lavados com água tratada, por três
vezes, removendo-se manualmente os que boiaram; em seguida, os frutos verdes
foram catados e separados dos maduros, que foram descascados em descascador de café
cereja, sem o uso de água.
Os
grãos de café descascado foram colocados em bandeja de plástico com água destilada
suficiente para recobri-los e, no dia seguinte, foram peneirados e separados da
mistura constituída por água e mucilagem dos frutos, que neste trabalho denominou-se
extrato mucilaginoso. O extrato mucilaginoso foi analisado no Laboratório da
Analag Consultoria e Serviços, em Viçosa – MG, determinando-se os teores de K,
Ca, Mg, Na e N, conforme metodologia preconizada em Standard Methods for
Examination of Water and Wastewater (2005).
As
cascas foram postas para secar, em estufa com ventilação forçada, à temperatura
de 65 °C, durante 5 dias, após o que foi moída em micro moinho tipo Willye, TE
648. A farinha obtida foi analisada no Laboratório de Análise de Produtos
Alimentícios do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV, em Viçosa – MG,
determinando-se o teor de carboidratos, gordura, proteína, fibra bruta e
minerais, conforme métodos de análises físicas e químicas de alimentos do Instituto
Adolfo Lutz (2008).
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
Os
teores de K, Ca, Mg, Na e N determinados no extrato mucilaginoso dos grãos de
café das variedades Oeiras, Catiguá e Catuaí Vermelho encontram-se na Tabela 1.
Observa-se que o extrato contém elevados teores de K, Ca, Mg e Na,
destacando-se o potássio na variedade Catiguá, e que os teores variam entre
variedades e locais de cultivo. Os teores de K e Ca chegam a superar àqueles
registrados na banana e no leite, por Aquino et al (2014) e Monteiro et al
(2016), respectivamente. Além da presença de minerais, Camargo et al (2015)
constataram a presença de proteínas, carboidratos, vitaminas, fibras, cafeína,
ácido clorogênico e compostos fenólicos no extrato da casca de café robusta. Um
extrato com esses componentes pode ser utilizado pela indústria para fabricação
de diversos produtos como refrigerante, licor, repositor eletrolítico, energético
e outros.
Tabela
1 – Teores de minerais, em mg.L-1, no extrato mucilaginoso dos
frutos de café arábica de diferentes variedades.
Variedade
|
K
|
Ca
|
Mg
|
Na
|
Oeiras
|
662
|
179
|
60
|
19
|
Catiguá
|
3307
|
154
|
86
|
12
|
Catuaí vermelho a*
|
919
|
317
|
114
|
98
|
Catuaí vermelho b*
|
841
|
260
|
90
|
108
|
*Catuaí
vermelho produzido em propriedades confrontantes, situadas no município de
Araponga, Minas Gerais.
Os
teores de proteína, carboidrato, fibra, gordura, potássio e sódio determinados na
farinha da casca dos frutos encontram-se na Tabela 2. Os teores de proteína determinados
na farinha da casca das variedades Oeiras e Catiguá, com 9 e 8 mg.100g-1,
respectivamente, foram próximos daqueles obtidos por Barcelos & Gonçalves
(2011) na casca das variedades Catuaí, Rubi e Mundo Novo. Os teores de proteínas e lipídios foram
semelhantes e o de fibras é muito maior que aqueles determinados na farinha de
milho por Giacomelli et al (2012). A farinha da casca de café contém mais fibra
que a farinha de trigo, mais antioxidante que a romã e mais potássio que a
banana e pode ser usada em várias bebidas, na panificação e confeitaria
(SOUTHEY, 1919).
Foram
obtidos 3,8 e 3,6 L de extrato e 2,1 e 2,0 kg de farinha da casca a partir de
30 L de frutos da variedade Catuaí Vermelho cultivada em dois locais no
município de Araponga. Esses resultados indicam que o processamento de 480 L de
frutos, que é o volume estimado para se obter um saco de café, rende cerca de
59,2 L de extrato e 34,4 kg de farinha da casca, que
poderiam ser aproveitados
pela indústria para produzir alimentos, bebidas, fármacos e cosméticos.
Para
Tabela
2 – Teores de nutrientes e minerais, em g.100g-1, na farinha da
casca de duas variedades de café arábica.
Variedade
|
Proteína
|
Carboidrato
|
Fibra
|
Gordura
|
Potássio
|
Sódio
|
Oeiras
|
9
|
65
|
19
|
1
|
2700
|
5
|
Catiguá
|
8
|
68
|
12
|
0,8
|
5150
|
9
|
que
os produtos derivados do extrato e da farinha possam ser aceitos pelo
consumidor, é preciso que o processamento dos frutos de café seja realizado em
condições higienizadas, o que atualmente não acontece. A melhoria das condições
e limpeza nas unidades de processamento vem sendo praticada por vários
cafeicultores que produzem cafés especiais, sobretudo por aqueles que exportam
o café, posto que seus clientes são exigentes quanto às condições de higiene. A
higienização permitiria associar mais um diferencial ao produto, e,
evidentemente, agregar valor ao “café higienizado”.
CONCLUSÃO
O
extrato mucilaginoso dos grãos e a farinha da casca de café contêm proteína,
carboidrato, fibra e minerais e podem ser aproveitados pela indústria para
fabricação de vários produtos.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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C. F.; SALOMÃO, L. C. C.; SIQUEIRA, D. L. de; CECON, P. R.; RIBEIRO, S. M.
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Upcycling coffe cherries for food: ‘every major chocolate company is looking at
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http://www.foodnavigator.com/Article/2019/05/20/
Upcycling-coffee-cherries-for-food-Every-major-chocolate-company-is-looking-at-this>.
Acesso em 10 de julho
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